O gedau, grupo de estudo e debates em arquitetura e urbanismo, da Universida de Itaúna entrevista o arquiteto Sylvio de Podestá sobre o o papel da arquitetura e a arquitetura no papel. Belo Horizonte, maio de 2007
Arquiteto renomado em Minas Gerais e no Brasil, Sylvio Emrich de Podestá apresenta suas experiências e expectativas sobre as publicações de ontem e de hoje
Por: LEANDRO FLÁVIO DE OLIVEIRA I RENATA HERCULANO NOGUEIRA I RODRIGO PEDRO XAVIER I ROSAMÔNICA FONSECA LAMOUNIER I SANDRA NOGUEIRA
Assunto constante, principalmente no meio acadêmico mineiro, é a preocupação com as publicações no campo da arquitetura e do urbanismo. Atualmente as grandes publicações brasileiras se concentram em São Paulo e são poucos os arquitetos mineiros e as experiências urbanísticas de Minas que figuram nestas publicações veiculadas em larga escala e que alimentam as bibliotecas das escolas e escritórios de arquitetura e urbanismo.
As publicações continuam sendo de grande relevância não só para informar como também para formar uma análise crítica e uma pauta de discussão sobre temas centrais que modificam, influenciam e contaminam a arquitetura e o urbanismo da atualidade. As publicações eletrônicas hoje aparecem como recordes entre as fontes de informação utilizadas por estudantes não só de arquitetura e urbanismo, mas de todas as áreas. Cabe entender que estas publicações são também muito importantes, pois usam a interface informacional mais interativa entre jovens e adultos para divulgar e publicar.
A Universidade de Itaúna, através do Projeto de Extensão e Pesquisa denominado _gedau: grupo de estudos e debates em arquitetura e urbanismo, entrevista o arquiteto Sylvio de Podestá, que possui uma ligação direta com as publicações em arquitetura e urbanismo mineiros, através de participações e da própria editora AP Cultural. Sylvio também foi professor universitário e já esteve presente na Universidade de Itaúna (UIT) em vários eventos promovidos pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo.
A revista produzida pelo _gedau não possui um tema central – a arquitetura e o urbanismo são a tônica de todos os artigos, produzidos por docentes e discentes da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UIT. Mas para introduzir esta coletânea, a escolha da entrevista e do seu tema tem papel fundamental na inauguração dessa publicação, que visa demonstrar quão importante é organizar a produção mineira e veiculá-la, para que faça parte da bibliografia de formação dos futuros arquitetos das escolas de Minas, e também funcionar como vitrine para o Brasil e o mundo.
_gedau: A primeira questão está diretamente relacionada às publicações acadêmicas da área de arquitetura e urbanismo. O seu envolvimento em várias destas publicações, como a Revista Pampulha, a Óculo, a Revista AQUI e demais publicações do IAB, e a própria editora AP Cultural – fruto do seu trabalho, que possui diversos livros publicados na área – demonstra sua vivência. Gostaríamos que discorresse sobre suas experiências, apresentasse suas opiniões a respeito do assunto “publicações na área”, enfocando principalmente a publicação periódica.
SEP: Primeiramente agradeço o convite feito pela “número 1 ano 1”. Fantástico! Todo mundo animadíssimo e isso é ótimo! Mas eu queria começar com uma pergunta ou duas. Para quem é essa revista? Quem será o leitor dela? Qual é a base da linguagem? Porque a idéia de se ter um objeto escrito é para que ele circule, se multiplique de alguma forma. Não é algo que se leia se e guarde isolado. Ele vai para a estante, e esta estante tem que ter um giro que começa a partir de um olhar. Quer dizer, as pessoas têm que encontrar a publicação e entender o que está escrito ali. Então, não falem em “economês”! Não falem em financeiro, em ês! Não falem “arquitetês”!
O desenho de arquitetura em qualquer tipo de ferramenta é um hieróglifo, é uma coisa complicada. Essas convenções, o desenho, são na verdade uma linguagem universal, uma espécie de esperanto arquitetônico, esperanto de um grupo. Se enviarmos um “corte” lá pra China eles saberão que é um corte de arquitetura, saberão que ali é uma escada, a janela, e tal. Então, pergunto: qual é o público? E qual que é a língua em que vocês vão escrever?
_gedau: A princípio, pensamos em uma revista acadêmica – a primeira do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Itaúna (UIT) – à qual alunos e professores terão acesso fácil. Estamos buscando patrocínio para que a tiragem seja grande, possibilitando que os alunos recebam a revista, e, além disso, pensamos em atingir o público de arquitetos do Centro-Oeste mineiro. Assim fizemos no trabalho de divulgação da Semana de Arquitetura e Urbanismo da UIT de 2006. A Universidade de Itaúna pode ser considerada regionalista, o curso de Arquitetura e Urbanismo da UIT é regionalista. Não temos quase nenhum aluno de Belo Horizonte, a grande maioria é do Centro-Oeste mineiro, advindos de cidades como Pará de Minas, Itaúna, Divinópolis, tendendo para a região do Triângulo Mineiro. Assim, o primeiro público-alvo será o grupo de arquitetos dessa região e também as escolas mineiras de arquitetura e as bibliotecas. Consideramos como foco principal o meio acadêmico, alunos e professores, além dos arquitetos. Mas, certamente, isso pode ser extrapolado para pessoas de áreas afins.
Com relação à linguagem, acreditamos que a revista se restringe a um “arquitetês”, devido ao público-alvo mencionado. E também porque a maior parte dos artigos selecionados, tanto de professores quanto de alunos, é fruto de pesquisas dentro da área, e a maior parte delas é pesquisa voltada para o próprio trabalho do arquiteto. Então, é como se fosse um material de consulta. Ela não é uma revista vulnerável, como uma edição jornalística, é uma revista para se colocar na prateleira e anos depois ser resgatada para consulta.
SEP: Falando então das minhas experiências. Quando havia apenas a escola da UFMG, o curso era baseado em publicações. Nem todo mundo podia sair viajando por aí, então convivíamos muito com o ensino baseado em publicações. As informações sobre arquitetura eram de difícil acesso, um filme que falasse sobre arquitetura era coisa raríssima, o que existia então eram livros, muitos livros. Editoras como Gustavo Gilli e Rizzoli estavam sempre ali, a informação vinha através destes papéis. Então a gente só recebia, recebia, recebia. E no Brasil existiam algumas revistas. Até fins da década de 1970, o Brasil chegou a ter mais de 15 publicações de arquitetura, desde as deste tipo que vocês estão fazendo, até publicações um pouco mais “trash”, vamos dizer assim, que eram as dos DAs e DCEs, mais ligadas à arquitetura. Algumas com periodicidade muito complicada. Uma delas era o Caderno de Arquitetos de São Paulo, feito por uma única pessoa. Existia a Arquitetura e Construção, que era a Arquitetura e Engenharia do Godoy, de Belo Horizonte, uma revista que foi muito famosa na década de 1960, lançou esses arquitetos todos aí, como o Eduardo Guimarães, que depois virou seu editorialista. Nela escrevia o Sylvio de Vasconcellos. E, por exemplo, publicou pela primeira vez uma casa de Fernando Graça quando era ainda estudante. Era uma revista que saía daqui para o Brasil inteiro, mostrando a arquitetura modernista que estava sendo feita aqui, nas décadas de 1950 e 1960, que era uma “senhora” arquitetura. Estas publicações foram perdendo força e, neste espaço que se abriu, surge um informativo chamado Projeto, feito em papel “craft”, com oito folhas. Virou revista, uma revista poderosa, e um pouco mais tarde foi seguida pela revista “AU”. Mas eram revistas paulistas.
Tudo rodava em torno das coisas que se fazia naquela cidade. É claro que, de vez em quando, conseguíamos abrir uma brecha lá e publicar alguma coisa, mas era tudo em volta daquilo. Um dia, sentados nos botequins da vida – nesta época havia três pontos de encontro – o Saloon; um bar no Edifício Maleta, a Cantina do Lucas; e a Casa dos Contos – onde salvávamos o mundo, resolvíamos todas as questões que estavam nos incomodando, discutíamos arquitetura, discutíamos tudo. E comentávamos que a toda hora chegava alguém vendendo um livro de poesia ou de literatura, toda hora, aquela venda mano a mano. “Esse cara faz livro, olha aí, 200 páginas, 100 páginas”. Umas capas horrorosas, mas fazia. “E nós aqui só reclamando. Vamos dar um jeito nessa história, vamos devolver informação, vamos parar de só receber, principalmente essa informação que vem de São Paulo”. Isto foi numa época em que estavam fazendo edifícios horrorosos que eram chamados de “estilos internacionais” ou “international style”. Prédios estranhíssimos, feitos por arquitetos que já estavam virando a crista do morro. Já era um processo de degradação das cidades, esta que vinha reagindo leigamente e mal com os coloniais, mediterrâneos e tudo mais. Estas duas situações conflitantes enfeiavam, piorando muito as cidades. Eram prédios horrorosos, mas casavam com as informações das revistas que recebíamos. Isso acontecia no mundo inteiro, um troço meio fim de carreira, fim de uma época “x”, que não via como passar para a época “y”.
Precisávamos devolver informação, quer dizer, era uma espécie de antropofagia ao contrário: já tínhamos comido tudo, igual ao Bispo Sardinha, agora precisávamos devolver, era o que eu chamava de autofagia. “Estamos cheios, precisávamos regurgitar informações. Mas como?” Não sabíamos nada dessa história. Aí apareceu uma chance de fazermos um anexozinho, um encarte na revista Informador das Construções, que era uma revista de custos e preços, aquela revista chata: azulejo custa tanto, não sei o quê custa tanto.
Era a revista do Benito Barreto. Existe até hoje, patrocinada por algumas firmas, ela era e é o catálogo de custos que aqui da cidade. A PINI veio depois. Ela era uma coisa menos regional e hoje serve inclusive para auditorias e coisas deste tipo. Mas apareceu a chance de escrever lá, sempre tinha um artigozinho de engenharia, de arquitetura. O Éolo Maia escrevia muito lá, o Ronaldo Masotti, o Matu [Marcos Vinícius Meyer], e apareceu a chance, então, de ampliarmos isso aí. Assim, conseguimos transformar este encarte quase numa revistinha, com um nome desses parecidos com firmas de engenharia chamadas Seno ou Pert, uns nomes engraçados. Nós também usamos um desses nomes estranhos, chamamos de Vão Livre. Fizemos reuniões, escrevemos o nome na parede. Na época, os grafites estavam todos por aí, os grafites políticos estavam em alta, então escrevemos lá Vão Livre. Produzimos a revista.
A primeira foi em homenagem ao Sylvio de Vasconcellos, que estava exilado em Washington, um auto exílio, e acabou morrendo lá, exilado. Na segunda, começamos a falar de outras coisas, como habitação de baixo custo e outros assuntos. O editor, Benito Barreto, se incomodou um pouco com essa liberdade que tínhamos na revista. Por mais que ele fosse uma figura genial, penso que o incomodou o fato de o encarte ter uma pauta que ele não dominava. E diminuiu um pouco nosso anexo. Então resolvemos: “Não! Já que é assim, vamos sair”. Algumas pessoas ficaram e fizeram mais uns quatro ou cinco números, o [Joel] Campolina, o Marcus Vinícius, o João Diniz, que estava começando a aparecer, e outros.
“E agora? Não podemos ficar sem revista”, já estávamos com o vírus desta coisa de devolver informação. “Vamos criar uma outra”. Pronto, começamos. Só para escolher o nome foi uma eternidade, mas nos juntamos com três jornalistas, de um grupo que se chamava Caminho Novo: Um era poeta (Otávio Ramos), um que escrevia para cinema (Vitor de Almeida), e um outro, poeta e jornalista (Régis Gonçalves). Eles deram o primeiro arranjo, nos explicaram como é que se fazia uma publicação, linhas, paicas e não sei o quê, como é que corrige, quem faz a revisão, como é que se insere uma foto, como é que dá o crédito da foto, coisas que vínhamos fazendo meio na marra.
Resolvemos então fazer a tal revista. Não conseguindo achar um nome, infelizmente caímos mais uma vez no estereótipo, no lugar comum – Pampulha – mas tudo bem. E como é que se escreve Pampulha? Porque outra coisa que é importante nesse assunto – nós vamos falar disso um pouquinho mais para frente – é a imagem que se quer dar ao objeto, à revista. A imagem, a cara, o retrato da revista.
Tínhamos um sócio na época, o Thales, que era um desses geniozinhos das artes gráficas, e que fazia tudo a mão, não tinha nada de computador. Ele ficou lá rabiscando um punhado de idéias. Queríamos lançar a revista, mas não achávamos um jeito de escrever seu nome. O Thales acabou fazendo um desenho pequeno, que foi ampliado, alguém passou a limpo e assim ficou. Uma coisa meio manuscrita, até hoje não gosto muito, mas acho que ficou datado, como a Igrejinha da Pampulha, uma coisa dessa época – se fosse hoje ficaria parecendo um “bolo de noiva”.
Hoje é diferente, temos um bilhão de tipos, as tipografias e os computadores. Uma menina chamada Ângela Dourado, hoje é uma senhora publicitária, passou o desenho a limpo. Ela era estagiária, vinha da FUMA, chamava FUMA e parece que hoje tem outro nome.
_gedau: UEMG, do Curso de Design Gráfico da UEMG.
SEP: É, UEMG, mas era a FUMA, de onde saíram grandes designers gráficos. Bom, então começamos a fazer. Primeiro número, lançamento marcado para o Congresso de Arquitetos de Brasília. Nós, pobres mortais, o que fizemos? Colocamos um desenho de Niemeyer na capa, duas tirinhas das cores da bandeira do Brasil, e partimos para as entrevistas: uma com o Lúcio Costa e outra com o Niemeyer – que ele depois não deixou publicar.
Tivemos que substituir na última hora, por um texto que ele mesmo mandou, chamado Metamorfose, porque viu que o Lúcio Costa estava dando umas ferradinhas nele. Não gostou e substituiu a entrevista pelo texto. No dia da entrevista, ele estava bem solto, falou mal do antigo diretor da escola de arquitetura, que andava fazendo um pouco de críticas a ele.
Niemeyer sempre foi esse carioca que fala muitos palavrões. Reproduzimos ipsis litteris o que ele disse, e acabou que não saiu. Era uma entrevista muito legal. Com esse material, aconteceu nossa primeira briga, porque dessa revista participava a mesa inteira do bar, mais outros tantos agregados, irmãs, tias, tinha umas 40 e tantas pessoas fazendo essa revista, cada um com seu palpite.
Niemeyer não quer que publique essa entrevista, mas e quem quer publicar a revelia? Metade quis publicar, eu inclusive. Tenho-a aí até hoje, até já passei para a fundação Niemeyer, que não a tinha. A outra parte acreditava que não podíamos mexer com o mestre (Niemeyer). Ficou inédita.
Isso são coisas que vocês vão, de vez em quando, ter que tomar cuidado, que é a questão do direito autoral, o direito de defesa. Essas coisas todas. Na hora que se bota na praça alguma informação ligada a uma pessoa, sempre vai acontecer esse tipo de situação. Essa entrevista aqui, por exemplo, eu poderia dizer “não quero que saia isso aí…” Pois é, tudo bem, isso aí é bobagem, porque sempre deixei sair tudo, mesmo as bobagens.
A revista Pampulha foi lançada no Congresso de Brasília e foi um estrondo, talvez por ser uma revista nova. Sentamos numa mesa, metidamente, com a Revista Projeto, com a AU, com mais duas ou três revistas do exterior, e fomos discutir sobre publicação. Foi metididérrimo, e vendemos prá caramba! Vendeu tanto, que o livreiro que estava com a gente na época, o Carlão, uma ótima pessoa e que infelizmente morreu andando por aí vendendo livro, foi de ônibus e voltou com uma Brasília novinha. Quer dizer, ele comprou uma Brasília em Brasília, porque estávamos lançando a revista no Congresso de Brasília. [Risos].
A revista tinha uma tiragem em torno de 2 mil exemplares, o que era pouquinho. Depois passamos para 3 mil. A número 4 foi 5 mil, e ainda tenho 1.500 guardados!
Propusemos entregar 12 números para os assinantes que realizaram a compra em Brasília, e fizemos isso. Entregamos os 12 números, só que de 1978 a 1986, levamos oito anos pra fazer os 12 números. Entregamos até o último, ninguém reclamou.
_gedau: Mas o objetivo da revista era ter qual periodicidade?
SEP: Mensal (Risos). Mas ela tinha uma diferença grande de todas as outras. Primeiro era o subtítulo: ‘arquitetura, arte e meio-ambiente’, e depois aí foi acrescentado ‘cultura e design’, quer dizer, já estávamos bastante adiante dessas revistas só de arquitetura. A revista falava da arquitetura e do seu engajamento em outras áreas, o que sempre foi super necessário.
_gedau: Ou seja, pautava temas que hoje estão na ordem do dia.
SEP: Que estão aí! Hoje tudo virou sustentabilidade, mas na verdade é o conjunto de todas estas Informações, destas áreas todas, que fazia com que tivéssemos um caráter um pouco diferente daquelas revistas que só focavam projeto e entrevista, projeto e entrevista, as duas paulistas (AU e Projeto).
O mote da revista era: entrevistas, alguns projetos considerados iconográficos e depois uma espécie de memória. Falávamos de um arquiteto antigo, de um prédio antigo, coisas desse tipo. O assunto era completamente aberto e, quando incorporamos o design, veio a turma da FUMA – UEMG hoje – trabalhando numa área específica também. Era uma festa, porque todo lançamento, toda edição que saía, nós saíamos pelo Brasil afora lançando os exemplares.
Ganhávamos de duas formas: primeiro, levando informação, segundo, conhecemos lugares fantásticos e pessoas fantásticas. Isso fez como que crescêssemos muito, em todos os sentidos. Publicávamos a informação que as pessoas recebiam, então, tínhamos que ficar preocupados, porque havia um punhado de gente lendo.
Ou seja, tínhamos que ficar melhores, com uma bagagem um pouco maior para poder, na próxima revista, servir uma informação mais habilitada, sempre melhor do que as primeiras. Com isso, fomos incorporando outras coisas, a principal foi o humor. Era sempre uma revista bem-humorada, principalmente quando começamos a soltar receitas de culinária. Tem o “Empadão Goiano”, o “Frango com Ora-Pro-Nobis”, o “Camarão na Abóbora” ou “Escorpião com Jerimum”, que era para suprir uma deficiência da arquitetura na época: os arquitetos, sem emprego, estavam abrindo restaurantes. [Risos]. Para que isso acontecesse da melhor forma possível, resolvemos dar uma mão. [Muitos risos]
_gedau: Revista polivalente, hein?
SEP: Nosso “expert” na época era o Veveco, que era um “cordon bleu”, o Álvaro Hardy, mas todo mundo cozinhava. Sempre falamos que arquiteto no mínimo tem que saber cozinhar, para poder entender como é que projeta uma cozinha. Claro que não é só para projetar cozinha, mas tem histórias fantásticas de arquitetos que cozinham e, os que estavam desempregados ou iam abrir um restaurante, tinham a chance de receber uma informação quentinha, testada, porque todas as receitas eram testadas pelo grupo todo, comentadas, mudavam um pouquinho, aumenta a pimenta, e publicávamos, com ilustração, corte, fachada, vista de cima… [Risos]
_gedau: Eram degustadas!
SEP: Também. Tínhamos um editor do meio ambiente – era uma editoria muito importante, de responsabilidade do arquiteto Maurício Andrés. Ele começou a nos explicar porque proteger grutas, coisas que não sabíamos completamente na época, como utilizar, literalmente, o clima, todos estes recursos bioclimáticos que vieram logo depois. Fomos alertados, já nessa época, pelo Maurício Andrés. Também o meio ambiente e a poluição visual. Participamos de um concurso da Prefeitura sobre pontos focais da cidade, criticávamos também as formas de implantação, principalmente no Bairro Mangabeiras, daquelas casas imensas, com pilotis todos vazios. A crítica continua até hoje. O arquiteto Carlos Teixeira fez com o Grupo Armatrux, um grupo de teatro de rua, intervenções lá dentro, o João Diniz também já fez, etc.
_gedau: Você está falando dos projetos, em que o proprietário vai lá e compra um terreno…
SEP: É. Ele compra o terreno inclinado e põe uma tábua em cima. Essas bobagens sobre as quais, já naquela época, éramos muito bem alertados pelo Maurício Andrés. Tínhamos alguma preocupação inicial, mas com a revista veio essa quantidade de informações a mais, uma preocupação legítima em todos sentidos, todas estas coisas que estão sendo discutidas hoje e que já estávamos discutindo há 200 anos.
Numa dessas discussões (por isso acho que a revista é importante), fomos, por exemplo, contra o Aeroporto de Confins. Em uma matéria, numa das revistas, o título dizia assim: “O ronco dos motores vai calar a canto dos passarinhos”.
Porque aquilo era uma reserva fantástica, além das grutas que existiam e que foram enterradas com o Aeroporto de Confins, e isto só está na primeira etapa, vão vir outras por aí. Hoje o meio ambiente está mais forte, mas temos um governador que passa por cima de tudo, então, se não ficar por nossa conta resolver essas questões, vamos ter que, mais uma vez, calar o canto dos passarinhos.
A revista falava de tudo: política, comida, design, cartum. Sempre tinha um cartum, e sempre tinha a última página institucional – e esta nós nunca vendemos. A revista poderia existir até hoje, não era necessário muita grana, porque não éramos tão capitalistas assim.
Sempre fazíamos uma homenagem a alguma coisa, nessa época o John Lennon tinha morrido, alguém tinha dado um tiro nele em frente ao Edifício Dakota e, Gilberto de Abreu, que é um super artista plástico, um performático, homem atuante em várias áreas, desenhou o John Lennon que publicamos na revista número 4. Sempre havia atrás da Revista Pampulha uma homenagem a alguma coisa, aos índios, ao patrimônio, contra a devastação das cidades, sempre tinha alguma coisa.
Depois veio Elis Regina, Carlos Drummond. Havia uma área para o pessoal de música, o Clube da Esquina estava sempre presente. Porque estávamos lotados de informações e só tínhamos esta revistinha. Precisava ser mais grossa, porque tínhamos proximidade com todos esses grupos que hoje fazem parte da história da cidade – o Clube da Esquina, o pessoal do Grupo Corpo – toda esta turma de artistas plásticos novos, todos eles participavam, e ninguém ganhava um tostão. O lucro, quando muito, pagava as despesas, mas era ótimo! Era ótimo porque isso deu para a gente uma super bagagem.
Na seqüência disso, depois de entregarmos todos os 12 números, dos 45 (participantes) iniciais, sobraram poucos: eu, o Éolo, a Jô, o Veveco…
_gedau: Por que acabou?
SEP: Acabou porque a Jô, eu e o Eólo resolvemos parar. Já que apenas nós estávamos fazendo a revista, por que não fazer apenas livros nossos? Revista dá muito trabalho: embalar, colocar adesivo, entregar no correio, ir à banca, cobrar… um troço cavalar. E como éramos apenas nós, pensamos: “Vamos aproveitar essa estrutura e fazer alguma coisa ligada ao nosso escritório”. Quase fomos assassinados, porque as pessoas diziam ser uma ego-trip imensa: “Pó, o cara tinha uma revista para falar sobre tudo, todo mundo podia escrever nela, agora só falam deles, sobre o escritório deles!”. “Pois é, temos agora uma… Tem gente que tem uma home, como dizem quando se tem uma agência dentro da própria instituição, tínhamos agora um jornal só nosso, o 3Arquitetos.
Publicamos alguns livros, passamos a nos chamar 3 Arquitetos, os três que sobraram, alguns jornaiszinhos, e uma hora parou, porque o escritório separou geral. Em 1987, 88, separamos geral. Em 1990 não agüentei! “Já que ninguém faz nada, cansei!”
Aquela antiga antropofagia tinha voltado. “Temos que voltar a devolver, mas como? Vamos ter que montar uma outra editora”. Que nome? Sempre é a pergunta. A anterior teve um período que passou a se chamar Panela, diziam que só publicávamos as mesmas pessoas, mudamos de Caminho Novo para Panela Sociedade Civil Sem Fins Lucrativos. [Muitos Risos]. Esse era o nosso humor, se você recebia uma cutucada você devolvia dessa forma, Isto era muito bom.
Percebemos que para a nova editora não deveríamos usar uma tipologia tão tosca. “Vamos fazer uma revista e usar um nome com duas letras, igual AU, GA, AA”. E virou AP. E nunca revelamos o que é AP.
_gedau: E o que é AP?
SEP: Pois é. As pessoas traduziam assim: Arquitetura e Planejamento, Arquitetura e Plano, Arquitetura e não sei quê, não! AP é a mais familiar das editoras do mundo. O “A” é da minha sócia e esposa Gaby de Aragão, e o “P” é meu, de Podestá. [Risos].
Não passa de uma editora super caseira, mas que já publicou uns 30 livros. Iniciou-se em 1991, com o livro A formação do homem moderno vista através da arquitetura, do Cacá [Carlos Antônio Leite Brandão], e Ensaio sobre a razão compositiva, do Mahfuz [Edson da Cunha Mahfuz]. Depois, fizemos dois livros mais temáticos: Arquitetura vertical e Lojas.
Um dia a Gaby falou: “temos que fazer uma revista!”. Não estávamos mais agüentando esse negócio de sempre, o mesmo assunto, e fizemos a revista AP, uma revista mais sofisticada, mas praticamente feita aqui no escritório. Chamávamos o Cacá [Brandão] para escrever um texto, eu escolhia todos os projetos, programava, entregava, e pronto. Não existia um Conselho que ajudasse definir a pauta. A pauta éramos nós. O “P” sentava com a “A”, e falavam: “vamos publicar aqueles caras? Como?”
Passei a andar pela cidade sistematicamente. Antes eu rodava o Brasil todo, depois passei a andar pela cidade. Nos fins de semana, andava 300 km fotografando e depois ia atrás do arquiteto que fez aquilo, publicava e tal, juntava com uns textos e pronto.
Foi um sucesso, fizemos nove números. Aliás, foi até o número 8, mas nós começamos com o número zero
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Um dia resolvemos parar, pois ninguém mais queria a revista. Era uma revista bimestral, com seis números por ano. Porque numa revista, a principal questão é onde ela chega, principalmente para o anunciante, que quer saber se há grande quantidade de assinaturas ou de oferta gratuita. Com esse “mailing”, o anunciante sabe que está pagando por uma mídia dirigida. Então estávamos cheios de assinantes, mas na virada, quer dizer, quando fomos renovar a assinatura, dos 800 assinantes, só 100 renovaram. Ou seja, perdemos o único valor que tínhamos, que era esse punhado de gente agregada, para receber a revista. As mídias dirigidas são muito mais caras que as mídias espontâneas, então, perdemos esse negócio.
Tudo bem. Fomos para a Bienal de São Paulo. Lá, a “A”, de Aragão, participando de um encontro nacional de revistas de arquitetura, disse: “A única coisa que vim falar nesse encontro é que eu estou utilizando dessa plataforma para encerrar a AP”. Só que tínhamos ainda um punhado de assinantes, e conseguimos que esses assinantes recebessem a Revista Finestra que estava começando, e precisava fazer umas promoções. Assim, os poucos mais de 60 que mantinham a assinatura, acabaram recebendo a Finestra, uma cortesia do Vicente Wissenbach.
Acabamos com a revista, mas continuamos com a editora, e continuamos a fazer, quase sempre nesse formato 21x28cm – embora arquiteto goste de formato quadradinho! -, chamado formato Veja, um formato universal, que gasta menos papel. Nesse formato, o papel é subsidiado e boa parte das inserções publicitárias está formatada com base nele. Para se ter uma revista, por exemplo, do tamanho da El Croquis, é uma encrenca, porque é preciso fazer inserções com exclusividade, só para aquilo. E este formato Veja cabe em todo lugar, é igual à coordenação modular.
_gedau: Otimizado.
SEP: Uma é o complemento da outra, que é o complemento da outra. Na arquitetura também se usa este formato, os formatos ‘A’. É um pouquinho maior porque o papel precisa de uma “pega” para poder rodar, depois só faz um refilo.
_gedau: Um corte…
SEP: Um corte fino, no final. Então esse é um formato econômico pra caramba e tem essa questão de inserir a publicidade sem precisar fazer uma só para você. Assim são também os outros livrinhos. Basicamente, esses livros menores têm, como formato, a metade do A4. Mas arquiteto gosta daquele negócio quadradinho, fica mais bonitinho, a diagramação é mais fácil, mais bacana e tal. Acabamos mantendo assim e, com isso, publicamos todos nossos livros. Se observar a GA, a Rizzoli, o tamanho é este, quase tudo é desse tamanho. Só para números especiais eles soltam os quadradinhos ou quadradões.
_gedau: Mas e as outras internacionais, mesmo as antigas tipo a Quadern, a Lótus?…
SEP: A Quadern é um pouco mais larga, talvez no formato ‘B’, que é um pouco diferente.
_gedau: Mais larga um pouquinho, mas elas têm mais ou menos a mesma altura…
SEP: É, pode ser.
_gedau: A El Croquis é um pouco mais alta. Ela, na verdade, tem cara de livro, não é?
SEP: Agora, não é? Mas ela era fininha, mole, você punha na estante ela quase desmanchava, como quase todas as revistas. Isso é uma coisa que vocês têm que olhar: como é que vocês querem guardar as revistas – se deitadas, ou em pé, ou assim. Se ela vai ter lombada, se vai ser grampeada. Têm também de pensar na forma de catalogação. Algumas revistas são mais fáceis de catalogar. As pessoas não sabem, eu não conheço, nem os bibliotecários sabem catalogar periódicos de arquitetura. Eu já discuti isso na faculdade, e é uma coisa que vocês podem lançar como novidade.
_gedau: Bom, gostaríamos que falasse um pouco agora sobre as propagandas, a página do patrocinador.
SEP: Nas revistas de arquitetura, de maneira em geral, a propaganda é matéria, não é sempre institucional. A propaganda está quase sempre lançando ou mostrando um produto.
_gedau: É de interesse do leitor também, não é?
SEP: É, mas muitas vezes isso não é catalogado. Então, como você vai catalogar um periódico de arquitetura? É muito difícil, porque é todo seccionado. As cartas, por exemplo. Elas são respondidas quase sempre como um tratado, uma discussão. Quer dizer, é uma interação, e isso acontece também com os e-mails, nos sítios na internet. Na revista, essa interação acontece na sessão de cartas. É muito importante que cartas tenham essa dinâmica. Não é só “parabéns pela revista, eu adorei minha foto na pagina 16”. Nada disso, não é?
_gedau: São coisas que a gente deve acrescentar, inclusive, o que está sendo discutido.
SEP: E na hora que vocês focam mais o lado acadêmico, a revista passa a ter responsabilidade sobre aquilo que publica, inclusive como formação do currículo profissional. Tudo isso vocês vão ter que tomar conta, porque os textos publicados passam a fazer parte da bagagem do professor.
_gedau: As revistas mais tradicionais trazem uma diversidade grande de seções: Acontece, Agenda, Artigo, Projeto; a propaganda, que também é útil, Carta do Leitor e outras. A nossa revista é mais singela nesse sentido, pelo menos nesse primeiro número…
SEP: Não acho que seja singela, porque você vai ter uns 20 artigos ou 20 temas, não é? Sugiro que, na parte inicial da revista, vocês coloquem pequenos textos, como se fosse uma pré-explicação, o prólogo, como se faz numa tese na parte inicial.
_gedau: Seria a apresentação, prefácio ou editorial.
SEP: Isso enriquece a revista. Provavelmente a sua revista vai ser lida pontualmente, não vai ser lida em seqüência, como nas revistas normais. Primeiro uma fotinha ali, todo mundo satisfeito, fala-se só de coisas rápidas, depois adensa um pouquinho, e a cultura lá para o final, porque nem todo mundo está muito a fim de cultura, não é? Lá para o final, fala de cinema e tal… Mas tem um ritmo, o que é muito importante. Por isso eu perguntei no começo qual era o público.
_gedau: Um público que provavelmente desenvolverá uma leitura mais lenta.
SEP: É, uma leitura mais lenta, mas tem que pensar no ritmo. Se você organiza quatro matérias seguidas muito pesadas, o leitor chega esgotado à quinta matéria, mesmo que vá lendo picado. Acho que dosar essas matérias é um aspecto que pode ter um certo empirismo, mas tem uma técnica. É bom pensar sobre isso, uma matéria mais ilustrada perto de outra menos ilustrada, o que acontece?
Eu, por exemplo, não tenho vergonha nenhuma de falar, principalmente agora que estou com 56 anos, que detesto qualquer texto de arquitetura que não tenha imagens. Porque arquitetura, a principio, é imagem, sem imagem vira uma cascata genial! E Acho que é imprescindível que tenha. As imagens da arquitetura são os hipertextos, quando se fala, por exemplo, de uma fazenda do interior, se não tiver uma imagem para mostrar qual fazenda, o leitor passa por cima daquele troço. Por isso, ao falar de arquitetura, as imagens são fundamentais. Idem para os hipertextos, para os pés de página. Acho que elas complementam pra caramba.
“Ah, mas a minha tese!” Azar, ninguém lê tese! Tanto, que todo mundo que vai publicar tese tem que reescrever, ninguém agüenta aquela chatura. Impressionante! Eu só li uma tese… Eu não entendo essa burrice: você lê os livros todos para fazer uma tese, escreve tudo errado, dentro de uma formatação oficial, para depois escrever de novo e publicar o livro?! É uma bobagem da ABNT [Associação Brasileira de Normas Técnicas], que vem há 200 anos, para que os juízes não tenham que ler tudo, olhar por alto e ver se está bom. Penso que funciona deste jeito, tanto que tem muita tese ruim rodando por aí, não é possível que as pessoas tenham lido aquilo.
_gedau: Tomara que não, não é?
SEP: Então, de qualquer jeito, acho que essa linguagem é fundamental. E o ritmo também é fundamental. Pense num livro de contos, pode ser um Luiz Fonseca, pode ser um Dalton Trevisan, tem ali uma seqüência, que ele organiza igual a um CD de música. Você não pega um punhado de música e coloca aquilo ali. Existe uma história a ser contada…
_gedau: Se puser primeiro as famosas, ninguém vai escutar o resto.
SEP: Não. Mas na verdade, as famosas são inseridas para induzir a mídia radiofônica, eletrônica… Na verdade, tudo tem ritmo. E outra coisa: os espaços brancos fazem parte da revista. Não pode ser aquela coisa barroca, paredes todas cheias – espaços brancos chamam-se respiro…
_gedau: Vazio.
SEP: Vazio, tem que ter.
_gedau: Como o espaço vazio faz parte da arquitetura.
SEP: Da arquitetura, exatamente. Faz parte também do urbano, faz parte de tudo. Então, acho que na diagramação a coisa tem que vir nessa seqüência de espaços vazios, de ritmos, do adensamento. Por isso as letras – dizem as más línguas que você não consegue ler uma largura maior do que 15 cm sem se cansar. Por isso existe um negócio chamado coluna. Por que duas colunas, por que três colunas? As matérias menos densas são diagramadas em três colunas… Então, vamos justificar, para não ficar esses vazios, mas, muitas vezes, quando se justifica o texto, o vazio vai para dentro. Você tem que ficar resolvendo quase que artesanalmente.
_gedau: Já enfrentamos esse problema.
SEP: Para resolver isso é uma artesania que o computador não faz. Tem que ir diminuindo o espaço entre letras, aumentando o espaço entre palavras e tal, para ir acertando, ou hifenizar. Hifenizar é um inferno, porque muitas vezes o texto corre e o hífen passa para dentro do texto, não é? [Risos] Então, em qualquer tipo de publicação, tem um cara que é importantíssimo: o revisor. Cadê o revisor? Joga tudo nas costas do revisor. [Risos] Saiu errado? É o revisor. [Risos]. Foto ao contrário, coisas assim. Hoje é mais difícil foto ao contrário, porque ela é aplicada direto dos arquivos digitais, a não ser que ela já esteja lá ao contrário. Outra coisa são os scaners de publicações reticuladas, que dá aquilo que chamamos moiré – que é a sobreposição de duas texturas – isso é uma tragédia.
O tratamento de imagem é importante, não só da imagem fotográfica ou desenho, mas da imagem-texto. Texto também é imagem, cria um bloco ali, outro ao lado. Observar isso é fundamental, senão fica cheio de maus vazios, e é uma tragédia ler.
É preciso levar o leitor a entender o texto, e não a ficar prestando atenção ao texto. E às vírgulas, pontos e parágrafos…
Algumas coisas que parecem tradicionais, mas são importantes, são as versais – ou capitulares – como numa iluminura, quando você abre um texto, uma letra maior abrindo o parágrafo. Quem fazia isso muito bem era um inglês, Neville Brody, que diagramava uma revista inglesa chamada FACE. Ele levou a versal ao extremo, muitas vezes essa versal era uma página inteira. FACE era uma revista que só saía quando ele autorizava, quando ficava pronta. Era uma revista que todo mundo esperava. Lembra a Pampulha, só que a Pampulha não era tão bonita graficamente, mas todo mundo a esperava, porque sempre vinha ali um novo discurso.
Então, é importante olhar a tipologia, escolher uma letra. Essa escolha é dificílima, pois não basta correr para a Times New Roman. Revistas de arquitetura quase nunca possuem letras serifadas – serifas são essas perninhas que tem no desenho de algumas letras, tipo a Times. São mais usadas em jornais, semanários e livros, porque a letra sem serifa sugere uma lida mais demorada, e assim o leitor consegue não embolar o olhar. Então, para longos textos, a melhor leitura ainda é a das letras serifadas.
Estas letras são redesenhadas exaustivamente. A Folha, por exemplo, usa uma fonte que se parece com a Times. Aquilo foi redesenhado quatro, cinco, seis vezes. Abre um pouco mais o “A”, para não reduzir muito a fonte e aquilo não estourar, ou senão, vibrar. Muitas vezes você tem o “O”, o branco do meio, ou o verde, vibra ali e incomoda na hora da leitura.
_gedau: Como se desfocasse?
SEP: Fica vibrando mesmo, é impressionante. Vibra, porque a letra ou o tamanho escolhido está errado. A entrelinha faz vibrar o texto, o fundo faz vibrar. Por isso, quase todos os livros estão vindo neste papel um pouquinho amarelado, que cansa menos a visão e vibra menos. Então, este cuidado é sempre fundamental. Outra coisa: como é que terminamos uma revista?
O que tentávamos fazer na Pampulha, por exemplo, e com muito custo, depois tentamos também na AP, é que a publicidade fosse específica, que tivesse a ver com a publicação, não fosse simplesmente mais uma.
SEP: Como a revista de vocês vai se chamar? Para o primeiro filho, eu havia escolhido Rita, que só nasceu no terceiro – nasceram primeiro Pedro e Marcelo. [Risos]
_gedau: Você escolheu primeiro o nome!
SEP: É. Não entrei com ultra-som nem nada para saber o que era. O nome poderia ser revista do grupo “X”, que acho saudável, pra tirar logo essa cara de ser um relatório de análises. Outra coisa fundamental é um Conselho Diretor. Convidem pessoas que tenham representatividade, até na cidade, ou que já foram professores.
_gedau: Você se refere ao parecerista?
SEP: Não, não são pareceristas. É o grupo para o qual vão passar as intenções da revistas, autores, pautas, etc. A capa, que também é a identidade imediata e visual da revista, é de grande importância, já que essa revista um dia – quem sabe e torço – possa ir parar nas bancas. Acho que uma das funções futuras dessas revistas, mesmo que não sejam literalmente escritas para leigos, é fazer com que as pessoas conheçam mais sobre a função dos arquitetos. A capa seria esse primeiro olhar da revista.
Voltando à AP, a máxima da nossa editora é que gostaríamos de fazer livros tão bonitos quanto os da Taschen, mas que custassem menos e que nunca precisássemos colocar o Tadao Ando na capa para vender mais. O que se coloca na capa? Ela pode ser super informativa, como, por exemplo, a capa da AP 3, que fala de cidade… Pode conter quase tudo na capa: as matérias principais e outras só citadas, ou pode ser uma capa eminentemente gráfica, para atrair – igual passarinho quando vai para as flores e depois descobre o mel. Então, pode-se produzir uma capa desenhada como uma peça gráfica. Com pequenas chamadas, por exemplo, e, o resto, o leitor vai descobrir logo na abertura. É fundamental escolher a capa por estes dois olhares: uma capa eminentemente gráfica, ou uma que contenha informações.
Antigamente, havia um jornal fantástico, hoje é uma porcaria, chamado Jornal da Tarde, de São Paulo. Ele praticamente lançou esse conceito de caderno de cultura, que abria com uma super foto, e um pouquinho de texto. As fotos são realmente muito bonitas e, como o jornal tem um formato muito comprido, as fotos descem de cima a baixo.
Jornais antigamente eram uma tragédia, cheios de pequenas informações. Quem mudou isso foi nosso querido Amilcar de Castro. Ele redesenhou o Jornal do Brasil, jogou todos os classificados para dentro, criou a página principal, que é essa coisa de chamar a atenção para as matérias que estão dentro.
Abre-se com uma foto, com uma super notícia, depois duas ou três notícias, e chamadinhas ao lado. Revolucionou a parte gráfica dos jornais do Brasil e quase do mundo inteiro. Hoje todos são iguais. Isso aconteceu aqui, no Rio de Janeiro, com o nosso conterrâneo Amilcar de Castro. E revista também era uma coisa! Quase tudo estava na capa, quase não precisava abri-la. Sem contar a propaganda de Capivarol – essas revistas sempre tinham uma capa com cara de mulher. As revistas mudaram muito!
O que vocês querem desta revista?…Vocês querem que ela exploda, ou que ela fique calma e seja bem recebida ali, com toda categoria do mundo, sem precisar usar terno e gravata? Você pode ser chique sem ter que virar pingüim.
_gedau: Claro!
SEP: O design é fundamental.
_gedau: Principalmente porque é uma revista de arquitetura e urbanismo, não é?
SEP: Exatamente. E a diagramação de uma página parece muito com a composição de uma fachada, de aberturas, de cheios e vazios, e tal.
_gedau: Queremos também discutir a dicotomia existente entre revistas eletrônicas e revistas impressas. Hoje, na arquitetura, existem informações em formato impresso e também existem vários portais, sites de interesse. No Brasil, temos o Portal Vitruvius, que já se tornou página de abertura de vários arquitetos e estudantes de arquitetura, acompanhado quase dia a dia. A Arcoweb, a Piniweb, as revistas eletrônicas, também acadêmicas, como a IA – Interpretar Arquitetura – da Escola de Arquitetura da UFMG, e outras…
SEP: Não chamo de dicotomia, mas de espaços complementares. Inclusive essa revista de vocês deveria ter uma versão eletrônica. Seria fundamental, porque são dois tipos de acesso. Hoje é muito mais fácil procurar um material na Internet, desde que você tenha um conhecimento prévio, do que em um catálogo. Claro que esses catálogos abrem chance de você acrescentar no seu mailing outras coisas que você não acharia se não estivesse pré-informado. Por exemplo, o Portal Vitruvius nunca seria uma revista. Ele tem hoje um valor porque consegue ser um banco de dados. Você pode buscar pelos links Arquitextos, Minha Cidade, etc.. Como a Arcoweb, por mais que se pareça com a revista Projeto, ela tem uma ferramenta de busca que agiliza muito na procura por alguns assuntos.
_gedau: E quanto àquelas que têm mais caráter de revista eletrônica e menos de portal, como a Interpretar Arquitetura? Nelas, também se tem acesso a outros números. O mailing existe.
SEP: Sim. Fora os outros links, que você abre e não pára nunca, e vai chegar lá no universo paralelo. Acho isso fantástico, inclusive uso demais este tipo de informação. Mas tem outro aspecto… É a forma de absorver a informação. No caso de uma revista ou livro, o leitor está sempre numa situação muito mais confortável. Não se trata de folhear e enxergar, como se faz na Internet – “agora quero ver isso aqui”. O tempo que se gasta olhando a imagem e um texto, e anotando, talvez dê um diferencial… É como a diferença entre andar daqui ali ou flanar… Andar daqui ali é um locomover-se, tem toda a eficiência de um locomover-se. Flanar é olhar acima, admirar, ver, parar, ouvindo o canto, o barulho e tal – acho de uma riqueza sem par. É o caso do livro ou da revista impressa: pegar um objeto que tem características próprias de textura, de tamanho, de peso e de tipo de informação, esses cuidados com o tamanho da letra e tal, e ainda se acrescenta a informação. Acho que é um prazer diferente de receber a informação via Internet. Claro que há sites incríveis, acesso a banco de dados incríveis. Talvez seja a grande conquista deste tipo de informação: não precisarmos mais comprar todos os livros e revistas do mundo, não precisarmos ter todos os livros de todos os arquitetos. Por um lado, há uma renovação muito rápida do que se está produzindo. Por outro, isso gera uma angústia cavalar, principalmente para nós, do Brasil, que, de cada dez projetos, construímos um – e é o pequenininho, nunca o grande.
Podemos publicar tudo, mas publicar um livro como o que estou lançando agora é difícil… Alguns são projetos não construídos, os que chamo de “no constrution”. São projetos em que a arquitetura está presente, mas somente através da informação. Na informação impressa ou na rede, pode existir toda esta história do “no constrution”, de arquiteturas não construídas, revisitadas, não visitadas, lidas e toda uma seqüência para esta leitura.
Mas o grande diferencial não é a informação, pois podemos conseguir a informação nos dois tipos de acesso. O diferencial é ter parte de um trabalho envolvido nessa informação. A parte do objeto em si é o fundamental.
Outra mídia eletrônica é o CD, sobre o qual nem falo mais, porque literalmente já nasceu morto. É muito mais uma coisa para se guardar, arquivar – tem uma mecânica muito chatinha, que a Internet substitui. Essas bandas largas substituem com muito mais precisão e qualidade. Mas o interessante num objeto desses é que nele existe, como no disco e no livro de contos, uma intenção de ritmo, de forma, de adensamento, que não se consegue na Internet. Fazer com que o leitor vá descobrindo: ele pode ir e voltar sempre dentro do mesmo objeto. Isto é muito diferente de pegar um punhado de pontos e trazer da Internet.
Acho que é assim: informação, tudo bem, lá está lotado. Muitas vezes, até angustia ter tanta, porque você não sai dali de dentro. Mas a informação na mídia impressa tem esses sabores, que são impagáveis. Não só o objeto, mas também quem o fez, qual o grupo que está se apresentando para fazer isso e quer que você receba essa coisa, com determinado peso, ritmo, tempo de leitura. Coisas desse tipo. Isso aí vai estar disponível o tempo inteiro, para o seu flanar na questão da leitura, como se estivesse andando por aí. Acho que esse é o grande diferencial. Para uma publicação acadêmica, se ela for publicada também eletronicamente, é possível ter ali no meio do texto outros links e tal.
Agrada a uma parte da Academia, que hoje só lê Internet. Hoje se vê aí em algumas teses, por exemplo: “capturado dia tal”. E, se vamos lá onde ele capturou, tem, na verdade, um resumo sobre fulano de tal. A figura foi lá só para pegar o resumo. Todo mundo está querendo as coisas muito rápidas, inclusive formar-se muito rápido, com 25 anos já ser doutor e tudo e tal. É uma bobagem. [Risos]. Então, atropela-se muita coisa.
Acho que Internet é uma senhora ferramenta, mas, se o leitor não souber como procurar, primeiro vai ter que passar pela mídia impressa. Se ele não tiver uma informação prévia de onde deve ir, só visita os mesmos lugares. Não vai descobrir mais nada, não vai descobrir nunca uma Arquitetura Antilhana, não vai nunca discutir uma arquitetura que tem lá no sul da Turquia. Porque está bombardeado com Vitruvius, Arcoweb, Piniweb, que trazem sempre as mesmas coisas. Assim, retomamos aquela mesma situação do começo, da revista Pampulha, em que recebíamos tanta coisa e quase não devolvíamos nada à altura. Em meu ponto de vista, é muito melhor ter uma revista dessas, e um site onde você agiliza as trocas, por exemplo. A partir do momento que você lança neste site algum tipo de informação, realizam-se trocas: o cara pode retrucar, dá mais agilidade até o próximo número sair. Inclusive, parte das matérias pode até vir daí. Mas como objeto, como forma de leitura, como projeto técnico ou artístico, ou seja lá o que for, acho que ainda não existe uma forma de comparar literalmente as duas coisas. Por outro lado, tem a paixão, que é um negócio que não se explica muito. Eu adoro o objeto livro, o objeto revista, está cheio aqui no escritório – de coisa velha, nova -, adoro isso, como também adoro a Internet. Mas não troco uma coisa pela outra, uso as duas, da melhor forma possível.
_gedau: Cada uma tem o seu papel, ambas são instrumentos.
SEP: Por isso acho que isso não deveria gerar discussão. Façamos as duas. Acabou. E resolve essa história de uma vez.
_gedau: Já que a Web existe e ela tem lá o seu lado bom, como trabalhar isso no meio universitário, entre os alunos?
SEP: Isso já está sendo trabalhado e acho que com boas qualidades. Essa revista mesmo que o Cacá Brandão faz.
_gedau: A Interpretar Arquitetura (IA).
SEP: Tem muita coisa chata, eu detesto, falei no começo, que é a arquitetura só escrita – é um saco, coisa de filósofo. Acho que o arquiteto precisa de mais coisa, em todo caso, são coisas importantes que estão por aí, e a pessoa depois resolve se agüenta ou não ler.
_gedau: E quanto ao uso indevido que principalmente os universitários fazem hoje da mídia eletrônica, utilizando-a em substituição e não como complemento ao uso da biblioteca?
SEP: Mas tem um problema sério. O mundo está digitalizado de um tempo para cá. E alguns clássicos para trás? Para se inteirar realmente de alguns assuntos, é possível pegar dois ou três livros – não sei se na Internet vai ter algo sobre eles -, e são livros super interessantes, por exemplo, sobre pesquisas a respeito da superpopulação prevista na década de 1960 para um futuro próximo, as mega estruturas japonesas e holandesas, e não sei o quê. Como se resolveria isso, e problemas assim?
Não é possível encontrar, por enquanto, nada disso, a não ser uma pequena citação, que pode ter entrado em um texto de um cara mais velho. Então, enquanto o mundo não está todo digitalizado, as bibliotecas vão estar aí. Quando as bibliotecas todas estiverem digitalizadas, elas serão acervos, como museus. Já vi todos os Rembrandt do mundo, mas só contemplei uns três. Na verdade, de frente, eu só vi uns três. Gostei muito mais de ter visto estes três do que todos os outros. Numa coleção sobre arte, muitas vezes, não se tem a escala, o tamanho da obra. Só vi uma publicação – deve ter mais – falando de quadros e pinturas, que tinha uma escala, isto é, uma pessoa sempre do lado. Muitas vezes você olha um Rembrandt ou quem for, chega lá e é um troçinho deste tamanhozinho, não é? [Risos]
_gedau: Gera uma decepção.
SEP: Dá uma decepção cavalar. [Risos]. Acho que, se um dia as bibliotecas estiverem todas digitalizadas, vamos encontrar lá dentro esses objetos prazerosos. Alguns estão até em vitrines, como essas iluminuras do passado que tinham um tratamento incrível. A Bíblia do Gutenberg, só tem três no mundo, vale um dinheiro cavalar. Porque é um objeto fantástico. E temos hoje publicados objetos tão fantásticos quanto. De grande tiragem, pequena ou média, não interessa. Que sejam digitalizadas as bibliotecas todas para que todo mundo tenha acesso a todas as coisas do mundo. A biblioteca de Washington – me parece que é a maior do mundo – tem tudo. Eles até assinavam a Pampulha, para vocês terem uma idéia! [Risos]
_gedau: Fantástico!
SEP: Eram os primeiros a assinar, via Consulado Americano. Provavelmente lá deve ter uns 10% a 20% digitalizados, e não vai ser tudo digitalizado a não ser por aquele cara que vai lá com ferrinho de dentista, procurar naquele cantinho. As digitalizações vão vir pela insistência de alguém em colocar aquilo na praça, e assim vai se ampliando cada vez mais, num retorno ao passado. Mas tudo mesmo vai ser difícil, porque realmente algumas coisas vão ser esquecidas, a não ser por causa das bibliotecas. Não tem sentido digitalizar a Bíblia de Gutenberg, tem? Pegamos um caso extremo, só tem três. Então, tem? Eu vi a Bíblia de Gutenberg, mas pegar aquilo lá, aquele troço daquele tamanho, aqueles tipos de madeira, imprimindo papel, afundando papel grosso, é incrível! Então, “informação” é diferente de “informação através de”.
A informação pode estar toda aí, mas “através de”… Cinema, por exemplo. A digital está quase chegando aos 35 mm com a mesma qualidade. Mas ainda tem muito tempo para a gente sentar e ver uns bons filmes. Como também os CDs e DVDs agora estão melhorando, mas os CDs ainda não produzem certos ruídos, gravados nos laboratórios de música.
_gedau: De qualquer maneira, sempre existirá um público, porque tem muito a ver com a interação com objeto, com a questão dos sentimentos, do sentido. Tanto, que livro bonito é outra coisa. Compra-se um livro, também, por ser bem diagramado, capa boa, papel, imagens, etc.
Mudando agora para o viés teórico, como você acha que as publicações de periódicos ajudaram no surgimento dessa discussão teórica? Acreditamos que aquela conversa do IAB com a Ruth (Verde Zhein), há um tempo, em que foi mencionada essa transição – a AU, durante uma época tinha uma sessão que tratava de assuntos mais teóricos, depois acabou, depois voltou. A partir de quando começaram a existir os teóricos da arquitetura, aqueles arquitetos que refletem mais, que têm relevância, até para ser publicado?
SEP: Tenho uma teoria, mas não sei se vale… [Risos]. Em algum momento, houve uma espécie de perda de contato das escolas de arquitetura com o que, para mim, é a única coisa para a qual serve uma escola de arquitetura, que é ensinar a projetar. O resto é auto-alimentação. Esse negócio de formar estudante para dar aula, para formar outro estudante para dar aula, esse motor contínuo, não passa pela minha cabeça, mesmo sabendo que ele existe.
O que aconteceu? No fim da discussão dessa arquitetura que eu chamei de Estilo Internacional, na passagem que o crítico chamou de pós-moderno, existiam algumas coisas em paralelo, como o Deconstruction e outros contextualismos de maneira geral, conversando. Os departamentos de projetos haviam se esvaziado, as pessoas não estavam com vontade – não sei se a palavra é vontade – de ensinar uma arquitetura na qual não estavam acreditando ou não sabiam fazer. Os mais velhos não queriam rever suas posições, não se interessaram; e os mais novos já estavam querendo muito mais da performática atuação dos arquitetos Star(s). Do Star System – esses caras que a toda hora estão com uma novidade, uma hora desconstruindo, outra hora enrolando, outra hora embolando… Agora parece que fazer prédio em formato fálico está na moda… Jean Novel fez um, o Foster fez outro, o Calatrava está fazendo outro não sei onde, o fulano estava fazendo outro.
Então, essa seqüência de projetos do Star System, esse grupo de arquitetos que a toda hora está com novidade, atraiu muito mais os novos arquitetos do que pensar uma nova postura, algo mais ligada ao seu lugar. A arquitetura é feita para o lugar e não para a revista. Mas percebe-se que existe uma influência muito grande dessa coisa gráfica imediata de pegar um Herzog e já ir copiando essas madeirinhas dele, pegar outro desses, o Mecanoo, e os mais antigos (já estão antigos), como o Coop Himmelblau ou o Peter Eisenman e tal… E tentar repetir aquilo de uma maneira um pouco inconseqüente, no meu ponto de vista. Ou ainda, os que chamo de neo-neo-modernistas, que são estes das casas brancas, dos planos sucessivos, dos vidros verdes e outros planos, tal e tal. Então, me dá a sensação de que, durante um período, até chegar nisso agora, o departamento de projetos se esvaziou.
Nessa época, a Escola de Arquitetura da UFMG, que é um grande exemplo, amplia a força do departamento de teoria, quer dizer, a Escola já se dividia em departamentos e, no lugar de um grupo, começa a separação: departamento de teoria, departamento não sei de quê, departamento de projeto, criam-se três ou mais castas, digladiando entre si, quando, na verdade, devia estar todo mundo junto.
O Cacá [Carlos Antônio Leite] Brandão, que é muito inteligente e tem um texto muito interessante contribuiu muito para a subida do departamento de teoria e crítica, enquanto que o departamento de projetos vai lá para baixo. E ninguém sabe projetar mais, e a escola passa a produzir muito mais textos do que projetos.
Mas junto a isso, uma coisa boa: surge a explosão do computador e uma facilidade muito maior de produzir e editar textos, mesmo em pequenas tiragens. Aparecem as gráficas rápidas. Vejam as teses de hoje, o autor já tira seis ou sete cópias, que vão para duas ou três bibliotecas. Esse tipo de procedimento evitou que ficássemos lendo somente Peter Frampton e aqueles velhos livrinhos, do Schulz, essa turminha. Anteriormente tínhamos que passar por todos esses, uma “via crucis”. “Você ainda não leu Argan? Você não leu Schulz?”
Isso era uma briga minha com o Cacá, éramos inimigos mortais, porque tudo era Schulz, Schulz. Um dia fizemos (eu, Jô e Éolo) uma exposição na Escola de Arquitetura e, pusemos essas maquetes todas aí. Fomos gozados e malhados pelos alunos. Dispusemos papel ao lado para que os alunos emitissem opiniões, e só aparecia: “isso parece um bolo”, “que coisa horrorosa”, “não leu Mies van der Rohe, não?”, essas bobagens todas. E o Cacá ia lá e dizia: “cuidado, existe outra forma de ver arquitetura”. Ele ia respondendo a todas as pedradinhas que os meninos estavam dando na gente. “Bom”, pensei, “vou conversar com esse cara. Vamos parar com essa briga e vamos fazer o seguinte: você vai me dá uma aula de tudo o que você sabe, e depois eu te dou uma aula de tudo o que eu sei. Você topa?” “Topo”.
Fiquei uma semana tendo aula com ele na Escola de Arquitetura, e depois ele veio para cá, ficou aqui uma semana. Hoje ele é meu compadre, padrinho do meu primeiro filho, então… [sorriso] somos super amigos. Então, nós, de alguma forma, reunimos o projeto e a teoria aqui dentro de casa ou no boteco, tomando cerveja. Coisa que a Escola de Arquitetura deveria ter feito e não fez até hoje.
Mas com relação a essa facilidade de os textos aparecerem… Inclusive, eu acho que é um veículo complementar incrível, e é ótimo ter as pessoas com disponibilidade para divulgar, tirar das gavetas textos que estavam perdidos, que não iriam virar livros, que não iriam virar nada, ou comentários, quase crônicas, como são feitas no Portal Vitruvius, na parte Minha Cidade. Lá é muito mais uma crônica do que um texto teórico.
Disponibilizar isso é uma abertura de gavetas genial. Você não tinha uma matéria para virar livro, mas também não queria deixar de dar a sua opinião. Um conjunto desses, como nos Arquitextos, do Portal Vitruvius, é o que chamamos “índex”: você se interessa por um assunto de que nunca ouviu falar, e a partir dali corre atrás das outras informações, para acabar de balizar todo aquele universo. Isso eu acho que é um grande ganho.
Agora, não sei como as escolas vão fazer com o departamento de projetos, que continua fraco. De maneira geral, um recém formado está muito mais apto para escrever um texto do que fazer um projeto. Talvez o departamento de teoria ainda continue mais eficiente do que o departamento de projetos. Ou então, não existe interesse de imediato em sair por aí, formando escritório de projetos, porque sabe-se que não se tem mais aquela chance de abrir escritoriozinho, de entrar serviço e ir crescendo devagarzinho.
Existe todo um procedimento pós-escola, e hoje é muito mais complicado do que antigamente, muito mais complicado, por exemplo, do que passar a produzir textos e voltar para a academia, com experiência muito mais de textos do que de projetos. Não tenho nada contra, mas também não tenho nada a favor. Quer dizer, a somatória disso – juntar o Cacá com o Sylvio – eu acho importante. Esse seria o único jeito de a escola voltar a ter todas as condições de produzir interesse nas pessoas, para que elas saiam dali, primeiramente arquitetos, e depois arquitetos que possam fazer outras coisas, inclusive dar aula, senão a escola não tem finalidade nenhuma, do meu ponto de vista.
Esta falta de cabedal, talvez de estrutura para discutir mais o projeto, tem valorizado muito a parte de teoria. Ou seja, a figura está ansiosa lá dentro para aprender, ela não consegue descarregar tudo no projeto como a gente fazia: perspectiva, maquete… Então, acaba levando isso para o lado do conhecimento, não sei como chamaríamos esse conhecimento, mas um conhecimento muito específico.
Por isso, tem muita gente fazendo tese ligada à filosofia. Tenho uma amiga que está escrevendo sobre Patologias de Edifícios, uma tese que ela está desenvolvendo em Ouro Preto – teve chance de fazer lá, eu acho simpaticíssimo, vai ser uma grande patológica de edifícios. [Risos]. Talvez isso evite que ela cometa tantos erros em edifícios na parte de engenharia, mas pode cometer todos na parte da arquitetura, não é? Não sei se essa minha teoria tem validade, talvez você possa responder, uma vez que está trabalhando com o departamento de teoria e talvez tenha outros olhares.
_gedau: Concordo com você, houve uma época onde o corpo docente da área de projetos era mais fortalecido, e das outras áreas menos, e agora existe um fortalecimento das outras também, não só de teoria, mas do departamento de tecnologia, de urbanismo, onde há grande número de profissionais especializados, inclusive pelo aumento dos cursos de pós-graduação nas respectivas áreas. É interessante porque parece, então, que as publicações tornam-se realmente um reflexo claro, um espelho das escolas, porque antes existiam muitas revistas que publicavam somente projetos, não é? Não que não haja bons projetos na atualidade, mas hoje começam a emergir, de forma intensa, os textos. Textos que vão para as revistas. Bons textos e maus também, mas bons textos aparecem.
SEP: Pois é, então voltemos ao início. Quase sempre começávamos com uma revista chamada de zero ao invés de um, porque era uma espécie de teste inicial, como se, ao abrir um restaurante, durante uma semana você oferecesse comida de graça. O número zero é experimental, é um número que tem pura imagem, e no qual trabalha-se três ou quatro assuntos, independentemente da amarração, só para testar como esses assuntos são colocados. E também, de maneira geral, é uma forma de fazer uma enquête, uma pesquisa de como isso será recebido. Por isso, acho super importante o número zero.
_gedau: Retomando o assunto, você acha que não se justifica o arquiteto que teoriza, mas não pratica?
SEP: Então, para que serve? A não ser para dar aula.
_gedau: Para dar aula, serve?
SEP: Acho que a arquitetura não é uma matéria teórica, é uma matéria prática, que precisa de teoria, de todas as teorias possíveis. Então, se você é parte de um grupo que está disposto a fazer pesquisa, desenvolver informações para que as pessoas possam utilizar disso para serem arquitetos, acho ótimo, fundamental.
_gedau: Até mesmo porque a teoria depende da prática, não é?
SEP: Ou junto, sei lá. Em tese, uma coisa vai alimentando a outra, de alguma forma.
_gedau: No nosso trabalho sim, mas uma teoria propriamente dita acerca de um assunto é escrita após uma certa prática.
SEP: Mas só enquanto analítica, porque ela pode ser prospectiva também, não pode? Ela pode olhar para frente, e terá que incorporar nessa prospecção algum conhecimento da prática. Assim, acho que pode ser feito. Mas a escola é para formar arquiteto, repito. E se precisar de outras pessoas que não sejam arquitetos para dar aula, por exemplo, de teoria… Quer saber? Acho que todo arquiteto deveria passar pela Escola de Belas Artes, como deveria passar pela Escola de Direito, pelos laboratórios estruturais e de bioclimas, de análises ambientais, e de todas estas coisas que fazem parte de outros grupos. E só se formaria arquiteto com essa quantidade de coisas, juntas.
_gedau: E a graduação, é suficiente?
SEP: Claro que não! Cada vez menos. O que existe hoje? Existe um currículo médio, mas ninguém deveria ficar por conta de uma faculdade ou de uma universidade como a federal, se num centro de pesquisa pudesse alçar vôos cavalares. O estudante paga R$750,00 por mês ou R$800,00, sei lá quanto, e quer receber de volta um curso que não o detone a cada fim de semestre. Ele não quer pagar de novo, então, existe uma carga média, em todos os cursos… Até os que não são só comerciais – como, por exemplo, as PUCs – ficam no meio do caminho, sugerem que a partir do momento que sai da escola o aluno já passe por uma extensão, ou uma pós ou um mestrado, não somente visando essa coisa de voltar à faculdade, mas para aprender mesmo. Por outro lado, isso é um perigo, porque estamos criando especialistas. Eu tenho uma amiga com três anos de formada que só entende de hospital. Não peça a ela para fazer casa. Não, arquitetura não é isso…
_gedau: A formação do arquiteto, na graduação, ainda é uma formação generalista!
SEP: É eu acho que é fundamental.
_gedau: A arquitetura ainda não passou pelo processo de transformação, como a engenharia, em que a formação, na graduação, se desdobrou.
SEP: É a engenharia se desdobrou.
_gedau: Há, sei lá, 30 engenharias diferentes.
SEP: Exatamente.
_gedau: No nosso Conselho, temos isso, não é? No Conselho Nacional/Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia, temos, sei lá, 30 engenharias diferentes…
SEP: Mas acho que a arquitetura não deve fazer isso.
_gedau: Se desdobrar?
SEP: Não deve se desdobrar. Ou você faz arquitetura, ou você faz hospital. Ou você faz arquitetura ou você faz loja, sabe? [Risos] Eu, por exemplo, eu nunca projetei hospital e, se um dia for chamado para projetar um hospital, vou aceitar na hora, vou chamar todo mundo que sabe de hospital para me dar informação, porque arquitetura eu sei.
_gedau: Estão aí as novas diretrizes curriculares de 2006/2007, que fizeram baixar a carga horária mínima do curso – antigamente era de 6 mil e tantas horas, depois caíram para 5 mil, depois para 4 mil e poucas, e agora 3.600. E essas diretrizes também não determinaram o tempo de duração mínima do curso de arquitetura e urbanismo. E estão pipocando por aí cursos de curta duração, cortando muita coisa em termos de conteúdo. E os professores, contribuindo… Você já falou que não se deve confiar em arquiteto que fique menos de x anos na escola!
SEP: Não sei se a palavra seria escola, mas pelo menos tentando aprender, não é? Realmente não sei quantos anos deve ter um curso de arquitetura. Sei que existem outras formas de levar o curso. É claro que isso aí sugere que as pessoas não sejam desonestas, sacanas, querendo se formar rápido, coisa desse tipo. Tem uma escola de design em Barcelona, que se chama Mossa. Fazendo uma espécie de figuração dessa escola, é como se você entrasse num salão muito grande e tivesse todas as matérias flutuando por ali. E você vai lá e escolhe uma, escolhe outra, de acordo com o que acha que deve ser a sua formação, com a orientação do professor. Inclusive, não existe departamento nesse lugar. É aquilo que sempre falei: “escola não ensina nada”, nem deveria. Tem um texto, que acho até meio sacana, que diz: escola é o lugar – já que nós estamos falando de livros – em que você é obrigado a ler livros que você não tem saco para ler em casa, e o professor é a pessoa que os coloca em ordem pedagógica. De uma maneira geral, é uma espécie de ajuda que você vai buscar para ir escalando alguns conhecimentos, para poder ir cruzando com os próximos.
Quando cheguei à Escola de Arquitetura, por exemplo, eu já sabia desenhar há 200 anos, e tive que agüentar lá dois semestres, com professores que sabiam desenhar muito menos do que eu, porque eu deveria responder por uma matéria que eu já sabia. E você deve ter lá, como existem alunos que vieram da Engenharia, gente que já trabalha em construção, etc.. Quer dizer, eles já sabem uma parte, mas precisam da outra. Então, as escolas são muito engessadas nesse sentido. Por isso, não sei se são necessários quatro anos. Para alguns devem ser seis, para outros poderiam ser três e meio. Só não poderiam existir escolas como vi por aí…
_gedau: Então você concorda que a história da flexibilização curricular é muito boa?
SEP: Pois é, mas existe a desonestidade. Eu vi, por exemplo, em bancas de TFG, não interessa onde, professores falando: “não dá essa nota ruim para ela, pois, na verdade, ela fez arquitetura só por fazer, não vai nem praticar, então, tanto faz ela estar aqui ou não”. É preciso ser, no momento, meio policialesco ainda, porque as pessoas não conseguem suportar uma liberdade total. Eu me lembro que ficaram muito impressionados com a escola que apareceu na década de 1960, para pimpolhos, antes dessa explosão de jardins de infância. Uma escola na Inglaterra chamada Summer Hill. Lá os meninos podiam fazer qualquer tipo de coisa, inclusive andar pelado, o tempo inteiro – uma escola completamente libertária, baseada em alguns princípios da época, algumas coisas do Huxley, dos hippies, de algumas pesquisas pedagógicas. Ela era tão libertária que não suportou as pressões. Os próprios pais, que no começo acharam que aquilo era uma chance de mudar a forma de ensinar, mais para frente não suportaram. Por quê? Veio essa política econômica liberal, vamos dizer assim, que acirrou um tipo de concorrência cavalar, que fez com que as pessoas disputassem, com o seu amigo do lado, um cargo x ou uma posição y.
O esforço em cima do trabalho e o ganho físico eram muito mais importantes do que outras questões que estavam envolvidas em outras discussões. Veja-se a França hoje, pagando a pena de ter sido mais socialista do que devia, com cargas horárias mais baixas, mais tempo de férias, e não sei o quê. Hoje ela esta pagando, porque está crescendo menos do que o mundo exige. Então, essa mistura de coisas faz com que se tenha uma escola muito mais competitiva entre as pessoas, do que uma escola honesta, onde as pessoas vão aprender alguma coisa. Fica difícil primeiro fazer com que essa escola resolva todas as questões individuais de cada um, só porque um tem uma vertente cavalar ou um pré-conhecimento.
Algumas inclusões que estão sendo feitas, através das bolsas para pessoas carentes e coisa desse tipo, por incrível que pareça, estão criando deformações imensas dentro das escolas, porque você fala sobre uma praia, uma montanha, ou uma estrada, e as pessoas nunca saíram do lugar, portanto, não têm essa informação. São alunos que não têm informação nenhuma, a não ser do bairro deles, junto com alunos que fizeram curso na Alemanha, falam três línguas, isso tudo no mesmo baú. Vai virar uma encrenca. E para não virar encrenca cria-se uma linha média, não é? E a partir daí, as pessoas lá na frente resolvem, dentro da sua capacidade financeira, ou de astral, ou de momento, para onde vão.
Alguns com muito sucesso saem por aí a mil por hora, são super bem informados, sempre tiveram bagagem, outros vão sofrer pra caramba, e talvez nem virem arquitetos, talvez virem técnicos, talvez desenhistas, coisa deste tipo. Esse é um perigo que vamos ter, por uns tempos ainda. Na hora em que as camadas sociais se igualarem – não sei se vou ver, mas espero que seja breve – quem sabe este tipo de abordagem da escola possa voltar a ser alguma coisa mais Summer Hill, mais libertária, onde se possa ter vários caminhos de conhecimento, todos ligados a uma idéia inicial, mas que possa, inclusive, fazer as pessoas retornarem para dentro da escola, como a AA faz, lá na Inglaterra. As pessoas passam por lá eventualmente. Você está lá tendo a aula, passa um dia o Peter Cook, passa a Zaha Hadid, passa o não sei quem, ou passam outros alunos, que vão lá e dizem assim: “estamos agora fazendo isso”, e enche a escola de informação, sem nenhum custo, nem nada. Você está ali num ambiente completamente aberto, onde as informações, fora da grade curricular, caem a toda hora em cima de você. Aí, é fantástico. Um início, por aqui, talvez seja uma Semana de Arquitetura, eventos em que possa haver trocas – o pessoal sai, vai para um ENEA, vai para um EREA, vai para uma Bienal.
_gedau: Fazem oficinas…
SEP: E aí as coisas vão se fechando. A escola poderia, talvez um dia, ter mais espaço em relação a isso, mas vai depender muito da nossa honestidade, porque sempre vão existir picaretas… E enquanto os outros não sabem comprar arquitetura, o que acontece?
_gedau: Compram o que oferecem.
SEP: É, compram o que oferecem.
_gedau: E com essa política do MEC e dos órgãos de fomento de pesquisa e de extensão, isso tende a piorar cada vez mais.
SEP: Sim, porque existe uma desonestidade, e a única forma que eles acharam para combater foi de policiar.
_gedau: É uma generalização absurda, doentia, tratar todas as áreas como se fossem iguais, não é? Defendemos que a escola de arquitetura e urbanismo precisa de professores que estejam envolvidos com a prática de projetos. Se excluirmos essas pessoas que optaram por uma vida profissional não acadêmica – não fazendo mestrado, doutorado, etc – estamos eliminando do cenário acadêmico uma contribuição que é muito valiosa.
SEP: É possível, mas eles não querem abrir precedentes. No jornalismo, por exemplo, não se pode ter só experiências teóricas. Vamos inverter, não só nas escolas, mas no caso profissional também. Nós falamos no começo que eu não queria botar o Tadao Ando na capa, para vender mais livro, não é? Mas o Tadao Ando, nunca entrou numa escola de Arquitetura. É um cara autônomo, aprendeu por aí. Depois que ele entrou, alguém carimbou o diploma e depois ele foi lá para dar aula, não é?
Isso pode acontecer sim, alguém ter experiências parecidas, é assim em qualquer tipo de área. Quando se chama um cara para dar alguma coisa, um Rubem Fonseca, ou não sei lá quem – citei Rubem Fonseca porque estou lendo um livro dele – não se vai falar assim: “você só vai dar esse seminário aqui se tiver mestrado, Rubem”. Você não vai falar isso com o cara, vai? [Risos] Ignácio de Loyola Brandão faz 500 palestras no mundo inteiro sobre literatura, até o nosso querido Roberto Drummond fazia…
_gedau: Existem os notáveis, ou de “Notório Saber”, e tudo mais…
SEP: Mas a escola não pode abrir esse precedente, por isso falo que é uma questão de desonestidade. Por isso ela precisa se armar contra quem carimbou um diploma x ou y de alguém, para que ela possa balizar os valores, porque senão abre precedente para um, abre para outro e outro. Aí, tem que montar um conceito cavalar, que quase significa uma análise de tese para poder colocar os que, teoricamente, seriam os de “Notório Saber”, a partir de uma analise x, ou seja, é um troço interminável para ajustar… Acho que não tem outro jeito: é assim mesmo que funciona, e mais para frente veremos no que é que dá.
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A entrevista ainda discorreu sobre assuntos variados, sobre muitos outros detalhes inerentes às publicações na área, tanto do ponto de vista de conteúdo quanto de forma (escolha de papel – cor, brilho, espessura – tipo, tamanho e disposição de fonte, tipo de encadernação e de paginação, programas empregados, uso de imagens e desenhos, notas e legendas, estilo de linguagem, cores de impressão, etc.). O arquiteto teceu uma grande contribuição para a produção da revista Estúdio.
A entrevista foi realizada no dia 5 de maio de 2007, no escritório do arquiteto, onde o grupo pôde conhecer parte da sua produção arquitetônica, em visita ao setor de projetos, conhecendo maquetes, painéis e demais peças gráficas, incluindo as que participaram de exposições. O arquiteto concedeu toda a entrevista explanando sobre a sua experiência na área de publicações, como uma mostra, em detalhes, nos vários exemplares que possuía no local. Da mesma forma, explanou sobre várias curiosidades da sua vida profissional como, por exemplo, as técnicas na feitura das maquetes, em que utiliza papelão. “Só uso papelão, porque não quero virar artista, quero que as coisas sejam resolvidas, do meu lado, rapidinho”. Falou também sobre o trabalho realizado com tinta e bisnaga de catchup.
Nos trabalhos de Podestá, a maquete surge a partir do croqui. Na seqüência, dependendo da pressa, tudo é fotografado e tratado no Photoshop. O resultado, às vezes, se parece com o do 3D Studio – programa empregado para o desenvolvimento de maquetes eletrônicas – ou não, uma vez que a maquete eletrônica exige um nível de detalhamento maior. Mas, às vezes, o arquiteto vai acrescentando coisas no Photoshop. No seu escritório, a maquete física é empregada na função “maquete processual” e, normalmente, depois de o projeto pronto e acabado, é desenvolvida a maquete 3D, exceto em casos como os de concurso, em que é confeccionada uma maquete física do produto final, mais representativa do que a processual.
Já a historia da técnica com bisnaga de catchup surgiu de uma experimentação em uma viagem. Conta Podestá: “Uma vez estávamos em João Pessoa, vendo o pôr-do-sol, e tinha um punhado de meninos enchendo o saco, porque o pôr-do-sol não acabava nunca. Aí, chamei os meninos, botei todos no chão, e os ensinei a desenhar o pôr-do-sol com mostarda, catchup e molho inglês.”