Tereza Cristina Motta, revista Finalmente – No. 10, Primavera/Verão de 1992
Publicada no livro Casas
Pergunta – O que é um espaço em arquitetura?
Resposta – Criar espaços é a própria essência do fazer arquitetura. Projetar é intelectualizar o espaço. A arquitetura é prioritariamente modificadora da paisagem, seja ela urbana ou não; e é através dela que o arquiteto devolve à sociedade novas relações com o morar, comprar, trabalhar, de divertir, pensar. É necessário que os espaços estejam de tal maneira concebidos que os usuários ali, além da proteção contra as intempéries, possa sob seus domínios criar estímulos e reflexões.
P -. Como é para você a relação luz, cor, forma e volume?
R – Como fazer arquitetura é criar espaços artificiais e intelectuais, a luz e a cor contribuem para que a forma e os volumes tenham momentos de clímax, recolhimento, confronto, introversão e extroversão; de relação com o urbano e com o natural; enfim, com todas as matérias que estão contidas na arquitetura, sejam elas psicológicas, técnicas, artísticas ou sociais.
P – Seu último projeto, o próximo e o preferido?
R – Um dos últimos é a residência Luis Carlos, Denise e meninos no Bairro Vila Castela em Nova Lima, região urbbana de Belo Horizonte. O próximo é um projeto ficcional para o vazio da Serra do Curral provocado pela mineração. Ele vai constar de um enorme edifício com forma semelhante ao pedaço retirado da serra, com milhares de jardineiras que recomporão parte da vegetação, onde deverão morar todas as pessoas das favelas próximas que, além de melhorarem enormemente sua condição de vida, liberarão as áreas hoje ocupadas por suas precárias moradias para investimentos particulares de lazer e morar, financiadores dos seus novos espaços.
Quanto ao preferido, são vários e em áreas distintas e, infelizmente, alguns não construídos: 1. Universidade Agrária da FESURV, em Rio Verde, Goiás pela abrangência acadêmica e social; 2. Museu do Homem Americano, em São Raimundo Nonato, Piauí, pela especificidade e internacionalidade do tema; Conjunto Habitacional Cidade do Brás, em São Paulo, pelo caráter urbano e social e pela oportunidade de se construir uma mini-cidade dentro da malha urbana de São Paulo e para uso específico de pessoas que hoje moram em cortiços; por fim, o Centro Cultural da Romaria, em Congonhas do Campo, Minas, pela possibilidade de participar de um projeto onde sua grandiosidade está na sua forma e implantação, onde construções simples e de pequeno porte compõem nesta sua disposição um cenário magnifico, seja pelo sítio onde se encontra, seja pelo pátio interno que contém. Além disto está numa colina vizinha ao do conjunto igreja/adro/capela dos Passos, projetado e construído pelo Aleijadinho. Melhor vizinho impossível. (Obs. Os dois primeiros projetos foram em parceria com Éolo Maia.)
P – Residencial, comercial ou institucional? Por quê?
R – Na verdade todos, desde que o cliente particular ou institucional esteja disposto a dar alguns passos à frente e contribuir no futuro para a leitura do seu tempo.
P – Clientes, quais e como é a relação com eles?
R – Os clientes podem ser individuais, podem ser formados por sociedades pré determinadas ou serem formados por comunidades dinâmicas, somatórias de diversos extratos sociais. Para o individual a resposta do arquiteto é personalística, traduz aspirações já conquistadas, relaciona-se frente a frente: são as residências ou projetos ligados a grupos e atividades determinadas. Logo em seguida vêem os projetos onde se conhece não as pessoas mas aspirações de grupos ou comunidades homogêneas em caracter social, religioso ou comercial/residencial: são os edifícios de apartamentos, clubes, igrejas, centros comerciais, escolas etc. Finalmente, os projetos ligados às atividades do homem: aqui o indivíduo é parte de todo um agrupamento social e político e suas atividades vão da unidade nome e participação até o grupo social e político, engajamento e mobilização: basicamente bairros e cidades.
Todos esses tipos de clientes são estimulantes. O percurso entre indivíduo e grupos abre um leque imenso de momentos onde a atividade do arquiteto é fundamental, e faz com que essa profissão possa adquirir espaços para contribuir na formação histórica de uma sociedade, além de fazer com que ela cresça em ambientes melhores e convenientes.
P – Estilo: Qual é seu estilo?
R – Ter um estilo determinado pressupõe participar esteticamente de um conceito que vai se repetindo como assinatura. Há tempos venho brigando com o que se convencionou chamar de arquitetura de autor e, em resposta a essa busca por uma leitura imediata da autoria da obra, contrapomos com uma diversidade de resultados técnicos e plásticos; neste caso, a palavra “estilo” se traduz como a seriedade com que se encara estes diversos tipos de projetos frente às suas relações técnicas, topográficas, climáticas, humanas e sociais.
P – Quais são suas fontes de referências?
R – Literatura nacional e internacional de arquitetura e de áreas humanas. Relacionamento com arquitetos e suas obras. Conhecimento de outras áreas como artes plásticas, literatura, cinema, publicidade etc., através de seus respectivos profissionais e ainda, participando como conferencista e visitante de atividades acadêmicas.
P – Quem são os maiores nomes da arquitetura contemporânea?
R – No Brasil há sempre lugar para Reidy, Flávio de Carvalho, Artigas, Niemeyer, Eduardo Guimarães, Paulo Mendes e outros da velha guarda. Dos mais novos, acho que Belo Horizonte contribui substancialmente para que a arquitetura hoje volte a ser discutida e apreciada e destaco Éolo Maia, Flávio Almada, Gustavo Penna, Júlio Araújo Teixeira, Carico e outros.
P – Preferência por materiais? Quais e porque?
R – Nenhuma preferência. O uso diversificado ou a eleição por determinado material é fundamental para a resposta procurada.
P – O que será a arquitetura do século XXI?
R – Espero que ela seja recheada de todas as conquistas que invariavelmente terão sido alcançadas, e que seus resultados estejam muito mais próximos do homem como um todo e, ainda, que sobre para este homem espaço para prospecções, discussões e otimismos.