1990: Museu de Arte de Belo Horizonte

Arquitetos: Sylvio E. de Podestá e Paulo Andrade
Texto: Carlos Alenquer
Local: Praça da Estação, Belo Horizonte, MG
Projeto: 1990
Área: 13.113,00 m2

O Museu é a Mensagem

Pensar um Museu, depois que ele deixou de ser aquela instituição simplesmente depositária de obras de arte, para se transformar num centro irradiador de cultura, implica em exercício dos mais instigantes.

Por um lado, o museu deve manter uma atmosfera acolhedora, confortável, silenciosa e  até modesta para permitir a reflexão e não interferir na contemplação e/ou participação e/ou interação do público com o quadro, o balé, o teatro, o vídeo, a música. Por outro lado, o Museu não pode abdicar daquilo que resulta sua arquitetura. Isto é: um Museu, por direito, é também um objeto de arte.

Objeto de arte que se relaciona não apenas com o conjunto arquitetônico que o cerca  no caso especifico, com a Praça da Estação -, mas com sua própria atividade de Museu, redefinida a partir do papel multifacetado que ele, agora, deve cumprir.

E por ser objeto de arte, em nosso entendimento, o Museu de Arte de Belo Horizonte deverá buscar em sua forma arquitetônica própria definição de seu espírito contemporâneo. Assim, o MABH, enquanto Museu busca/encontra sua própria mensagem: diz o que é, sendo ao mesmo tempo!

Internamente, a disposição dos espaços – grandes e pequenos – deve ter uma relação adequada com os objetos de arte, com as manifestações artísticas: A iluminação, uniforme, indiretamente refletida e de densidade apropriada, dá condições dos objetos se apresentarem em sua máxima potencialidade. Claro e completo: não evoca além da reflexão, o silêncio da mente aberta. Simples e modesto, ele não atrai a atenção do observador para si, apenas é um pano de fundo discreto para o realce das obras.

Museu de Arte de Belo Horizonte tem ainda outras responsabilidades. É responsável pelo acervo do antigo Cassino, dele se apropriar em todo o seu potencial – conservação, restauração, exposição. A este, serão acrescentados outros acervos, novos objetos, frutos de aquisição, premiação, doação etc. Induzir, como espaço contemporâneo, a manifestações internas e externas de todo tipo (desde que qualitativamente aprovadas por gerenciamento competente).E mais: abrir-se para todos, mesmo sabendo-se que sua localização, por si só, não é elemento fundamental para que as pessoas participam de suas atividades; ser seguro, porque guarda tesouros que são insubstituíveis e ao mesmo tempo ser transparente, porque estes tesouros são de todos; ser definitivo na sua engenharia e arquitetura, com uso de desenho atual e materiais duradouros; e finalmente, ser maleável nos espaços, para permitir os mais diversos tipos de manifestações artísticas.

Externamente, o MABH pergunta/responde sobre uma de suas funções: nas zenitais do pátio central, vinte e oito painéis de dois por três e meio metros abrem espaço para que artistas plásticos criem, no próprio Museu, as imagens de hoje, amanhã: vinte e oito visões da nossa arte contemporânea.

Respondidos os fundamentos deste Museu-Mensagem, fica ainda a se comentar a participação urbana e histórica no contexto da Praça da Estação. Esta Praça de características urbanísticas peculiares à cidade de Belo Horizonte, com alguns elementos arquitetônicos de época e, conforme edital, participante de uma volumetria, ou altura, que corresponda aos anseios dos estudiosos, com os quais – por sinal – comungamos.                   

Dando uma volta no Museu

Duas alas laterais e um grande vazio interno esta a estrutura básica dos nossos espaços. Nas extremidades destes vazios, os elevadores (panorâmicos e convencionais), escadas e rampas gene rosas. Outras circulações, como as administrativas e de serviços, convenientemente localizadas e protegidas, completam os acessos verticais. 

Todas as divisões e departamentos foram agrupados e relacionados de acordo com suas atividades funcionais e de atendimento às pessoas. Os acessos públicos, amplos, claros, confortáveis e independentes (edital), foram localizados para a rua Aarão Reis em sua maior importância, e, secundariamente, pela Praça. A razão desta escolha é simples: pretende-se, com ela, a interligação sequencial Foyer/Hall/Praça/Rua – sendo esta rua a que pretendemos abrir para pedestres e manifestações; para a Praça deixamos a atividade contemplativa, i. e., o edifício do MABH participa de todo o urbano/arquitetônico, sugere a atividade e convida – sem se abrir completamente. Com a aproximação; o convite torna-se indução e participação.

Para o acesso – agora pela fachada leste – o melhor sol para as atividades matinais: meninos desenhando no chão, palhaços, capoeiristas, sociedade de poetas performáticos. Com o caminhar do sol, a sombra protetora do próprio edifício marca no chão o local das atividades vespertinas; malabaristas, parnasianos, circo, picadeiro e saquinhos de pipoca.

Agradável, bonito e conveniente.

A Rua Aarão Reis, no.1, é o endereço do Museu de Arte de Belo Horizonte, ali, bem na Praça da Estação (rebatizada de Rui Barbosa em 1923), CEP 30120. Temos assim, pela Aarão Reis, ao lado do estacionamento sugerido, o pátio de manobras e o acesso de cargas e garagens privativas. Por ali, com toda a segurança, chegam ou partem os objetos, personagens importantes de uma das atividades do MABH. Pelo lado oeste, fachada devidamente protegida, se tem acesso às atividades gerenciais, funcionais. Ali é o coração administrativo do Museu com vida conjunta e privada – interna e externa: atende às necessidades do próprio Museu e do público que o frequenta.

Interligando a Praça da Estação, – a rua Aarão Reis, atividades também internas e externas: a lanchonete, em vidro – com domínio da amplidão do espaço da Praça e dos fluxos e atividades da Aarão/Praça/Foyer. Já no Foyer, a informação e a segurança encaminham para a galeria contígua, estar, acessos verticais e, ali, pela transparência dos andares acima, pela bem disposta programação visual, pelos vidros, se chega aos locais de exposição, cursos, oficinas, terraço de atividades ambientais, contemplativas e de arte.

Logo abaixo, o cine-teatro-auditório, a biblioteca, multimeios, com. foyer próprio e generoso, ampliam as atividades destes locais, possibilitam encontros e transformam o sub-solo em área ampla, arejada, nobre. Isso porque o Foyer Superior encontra-se um metro acima do nível do terreno, criando uma plataforma similar à do prédio da Estação, e com isso possibilitando circulação de ar e luz naturais. Arejada também por ser o único espaço publico do Museu que foi programado para ter, ambientalmente, seu conforto mecanizado, Depois da leitura e do debate, voltamos ao Foyer, folheando livros, prospectos e cartazes no posto de venda: passamos então à lanchonete para um refrigerante subimos ao segundo e terceiro níveis para uma releitura de exposições e, depois, vamos ao terraço superior – onde, além de grande plataforma para atividades ao ar livre, ou para simplesmente admirarmos alguma escultura convenientemente disposta com os visuais da Praça, participamos da interferência dos artistas plásticos nas superfícies das zenitais. O terraço superior mostra então para nós, em toda a sua plenitude, que o Museu é também elemento artístico como a própria obra que ele pretende conservar e expor.

Por estes espaços também circulam jornalistas, críticos e curiosos junto aos alunos e professores dos cursos, ateliês, oficinas que fazem a troca exposição/aula/terraço completando assim sua atividade didática.

Se o coração do Museu é a administração, pois é dela a obrigação de manter vivo este organismo, órgãos vitais como os acervos permanentes e em trânsito, são colocados no segundo nível. Ali, logo acima de montagens e restauração, os acervos têm toda a segurança, com suas paredes fortemente protegidas e seu meio físico conservado através de boa guarda e temperatura conveniente. Montagens, museografia, gráficas, fotografias, oficinas gerais completam esta área.

Sanitários, copa, depósitos, elementos de apoio fundamental foram dispostos com seus acessos ligados às atividades que se propõem a auxiliar. Tudo isso não teria a tranquilidade desejada se não soubéssemos que a Central de Vigilância, com seus elementos físicos e humanos, equipamentos etc., não formasse um conjunto que garantirá todas as atividades em harmonia. O passeio se completa quando saímos pela fachada sul e vemos aquele prédio de inspiração neoclássica, de “indiscutível elegância e uma inesperada leveza”: o Prédio da Estação.

Construindo o Museu

Com subsolo em concreto, protegido do lençol freático logo abaixo, surgem os pilares que suportarão a praça do Museu ( nível 0,00) e a plataforma do Foyer, Galeria, Lanchonete, Plataforma etc. (+1,00). Ali, em todo o edifício acima, a estrutura é mista. O seu grande corpo com o vazio central, em perfis metálicos com vigas atirantadas e treliçadas se mesclam com a área triangular, vizinha ao viaduto da Floresta, área de escada e elevador de serviço, em estrutura de concreto, estabilizando o conjunto que, pelas suas próprias características, pretendemos esbelto, conveniente.

Neste mesmo vazio, no primeiro nível, quatro grandes vigas em treliça, atirantam os pilares do Foyer, libertando o espaço do auditório logo abaixo (sub-solo). Esta transição, de leitura exposta, participa em sua transparência com a iluminação zenital que surge exuberante do teto. Em concreto também é a grande caixa d’água, apoiada sobre o volume formado pela escada e elevador de serviço e, junto com as pontiagudas zenitais, formam os elementos compositivos do terraço, tão feios, geralmente, e aqui artísticos. Além disto, é sombra para quem dali contempla a cidade.

Museu futuro, mostrando presente e passado

Evidentemente todos sabemos da grande responsabilidade – não apenas dos organizadores do Museu quanto à escolha das características que se pretende dar a este espaço físico (edital); claro que também os Jurados terão dificuldades em escolher, dentre os vários trabalhos, o que fisicamente melhor suportará não apenas as respostas ao edital – como a comunidade em que o Museu se insere; assim como, na ponta desta cadeia de responsabilidades os próprios arquitetos que trazem para a mesa um trabalho para ser julgado.

Como este é um país de memória fraca, é raro que se projetem museus neste lado do Equador. Como a urgência se sobrepõe às atividades ricas e duradouras, verdadeiramente condutoras de nossa memória cultural, fica até fácil perceber-se porque projetar museus soa com um tom levemente inusitado – para não dizer inaudito. Guardar o passado presente e propor o futuro confrontá-los e apreciá-los – isso é o que nos propusemos a fazer e a fazê-lo em local devido e rico.

O projeto ora apresentado é fruto destas observações, do estudo sistemático de outras instituições, da leitura criteriosa e crítica do edital – sem esquecer que o fato de não termos no país uma tradição (como a européia, nem imaginamos falar), um referencial rico, devemos nos dar à humildade de projetar um edifício para a cidade, o bairro, a praça, o lote no qual será erigido, que responda ao mesmo tempo a inquietações dos nossos dias, das nossas manifestações artísticas, pensando no futuro, sem perder a noção do nosso passado. É uma grande reaponeabi1idade, já dissemos anteriormente, mas é também um belo e fantástico desafio. Desta Praça, deste Museu, Belo Horizonte pretende mostrar maturidade, e mais do que isso: dar ao seu povo um local digno de ver/mostrar a sua grandeza.

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