Arquitetos: Sylvio E. de Podestá e Marcos Fonseca Emídio
Texto: Carlos Alenquer
Colaboração/desenho: Mario Caetano, Antonio Moreno e Paulo Andrade
Local: Sevilha, Espanha
Projeto: 1991
Área: 4.200,00 m2
Um Pavilhão Universal, Permanente, Nativo e Íntegro
O Continente Brasilis representado em todas suas peculiaridades, e não apenas nas suas tipologias folclóricas e/ou exóticas eis a nossa proposta para o Pavilhão do Brasil na Expo’92 de Sevilha.
Queremos um local de eventos diferenciados, mostra-sinopse da diversidade cultural do País, intelectualmente portador de informações locais (mas nunca estereotipadas), e ao mesmo tempo coerente com a universalidade da Feira e suas manifestações planetárias do saber arquitetônico, da engenharia, do conforto, da luz, do local.
Espaços amplos, generosos, sensuais, de circulações lidas e fáceis, cores contrastantes e materiais portadores de integridade construtiva e beleza plástica marcam sua concepção arquitetônica.
Sua engenharia prevê vigas radiais de concreto, balanços, cortinas, empenas e pórticos metálicos, conduzindo de maneira rápida, limpa e técnica a construção da obra. Permitida enquanto confortável, a luz de Sevilha é o elemento principal na concepção do espaço transparente do Pavilhão. Valorizando o uso das cores a claridade será irradiada, do alvorecer ao crepúsculo e sombreada, na proteção das aletas, quando muito caliente.
O privilegiado local, as cabines, o monorail, a proximidade com o já conhecido Pavilhão de Portugal, sugeriram ao tratamento da esquina forte elemento da arquitetura mundial – um valor exemplar: sua relação sutil e lúdica com a esquina portuguesa; sólidos laços de países irmãos.
Externamente, caminha-se por percursos suaves, reais.
E, além de se perceber a leitura interna do prédio, domina-se de forma natural, mas completa (diálogo entre o que descobre e o que é descoberto) a grande paisagem da Avenida do Descobrimento. Faz-se, assim, um Pavilhão onde em 92 estaremos discutindo, expondo nossa cultura étnica, geográfica, histórica; fauna, flora, momentos ecológicos, ambientais; artes, literatura, cinema, poesia, música, culinária; parte e suporte de toda esta atividade diversa, caminho para a modernidade simbolizada no Pavilhão que se pereniza após o evento, recebendo outras atividades, outros públicos. Sua capacidade de representar agora e sempre marcará este caminho que, finalmente, agora percorremos: Pavilhão do Brasil, Expo’92, Sevilha.
Um edifício símbolo, mais que um edifício simbólico.
O Pavilhão
Através de níveis com acessos de rampas, escadas e elevadores, criam-se fluxos horizontais e verticais, cruzados, que fazem do visitante elemento integrante da micropaisagem interna do Pavilhão, com sua leitura funcional feita visualmente de todo o seu térreo. O restaurante e lanchonete, informadores culinários e etílicos estão sugerido e aceito- ao lado do similar português, ao norte, permitindo uso contínuo junto e/ou segundo as atividades dos pavilhões. O auditório, no segundo nível superior, organiza os espaços do térreo, diferenciando pé direito e circulações. Exposição em espaço aberto sobre o auditório, liberta o espaço vertical, virtualiza a luz e engrandece os caminhos. Dali se domina a paisagem interna; além da externa. Todos os serviços, com entrada térrea oeste, estão localizados na grande placa norte/sul e, dali, seus tentáculos se estendem para as funções que pretendem auxiliar, como deve ser. Administração, serviços gerais e garagem, convenientemente instalados nos níveis inferiores (-1,20 e 4,00), com independência de circulação, completam o pool. O paisagismo, um pouco desestimulado pela não inclusão da área fronteiriça e pela exigüidade do prazo, foi tratado com a consciência devida e utiliza elementos de fácil transporte e adaptação, além de ser de porte médio e pequeno.
Dos materiais como o aço, o vidro, o granito e o mármore e de equipamentos convencionais, como elevadores e o ar condicionado, se conseguiu a racionalidade (pode ser todo fabricado e adquirido no Brasil). Do concreto aparente fundação, cortinas, estruturas e empena de serviço – valorizou-se a plástica, a engenharia e o uso universal de praticamente um só tipo de mão de obra no local. Universal, permanente, nativo e íntegro. Todo o material móvel utilizado cadeiras, divisórias, poltronas, sofás, louças, ferragens, deverá ter design nacional. (Texto apresentado no concurso)
Como todos sabemos, esta exposição a ser realizada em 1992, em pleno governo Collor, aconteceu sem o Pavilhão do Brasil. Na época, escrevemos um manifesto e que transcrevemos abaixo:
Pavilhão de Sevilha ou Até hoje a gente se pergunta: Que país é este?
O Brasil do ano 2000 é, definitivamente, o Brasil de 1500.
Nestes tristes trópicos, confundem-se, dentre outras coisas, a ignorância, a pobreza, a colonização.
Tomemos como exemplo o concurso promovido pelo Governo Federal, através do Ministério das Relações Exteriores, sob os auspícios do Instituto dos Arquitetos do Brasil, para a construção do pavilhão brasileiro na Expo dos 500 anos do descobrimento, na Espanha.
O pavilhão, privilegiadamente localizado entre os espaços de Portugal e Santa Sé referências didáticas-, literalmente empacou. O que nos permite acrescentar à ignorância, à pobreza, à colonização, um outro: o Brasil ultimamente vem se transformando em alguma coisa vergonhosa.
Que outra classificação poderia ser dada à atitude dos patrocinadores do concurso frente ao que ocorreu com o projeto Sevilha? Duzentos e cinquenta escritórios de arquitetura de todo o país trabalharam, num prazo mínimo, para que o Brasil não passasse o vexame de não se representar na Expo. Vale dizer: pelo menos mil duzentos e cinquenta profissionais diretamente ligados aos escritórios perderam dias e noites de trabalho para cumprir os prazos, em contar consultores, assessores, o que poderia elevar este número para quase o dobro.
Profissionalmente estas pessoas se submeteram ao regulamento, pagaram profissionalmente as inscrições, profissionalmente discutiram, projetaram e aguardaram profissionalmente o resultado do júri, enquanto amadorísticamente receberam como resposta o silêncio do Governo do Brasil (não esquecer: com o aval do IABDN), que se aquieta, inviabiliza a construção do pavilhão e transforma a participação do Brasil na Expo de Sevilha num ridículo estande se tanto- com a mediocridade geral transformada em apanágio de terceiromundismo brasileiro. É o calote institucionalizado.
A ignorância dos princípios básicos do profissionalismo que permite a enxurrada de concursos governamentais sem verbas alocadas, por exemplo, é apenas uma ponta da mentalidade colonizadora que escolhe júris sem discussões prévias com os participantes. O que está submerso, e torna vergonhosa a situação com que nos deparamos, é a pobreza de caráter de um governo com a aprovação do IABN -, que não tem a mínima decência em relação a um concurso por ele mesmo convocado. Um concurso que permitiria a discussão sobre nosso descobrimento, o nosso subdesenvolvimento e nossa perplexidade ante o fato de estarmos à beira de 2000 como se estivéssemos em 1500.
Tanta falta de respeito com profissionais, cidadãos de um país que nem descobriu ainda o que é cidadania, tanto desprezo pelos direitos mínimos de pessoas que trabalham pela construção desta mesma cidadania, tanta ignorância, pobreza, colonização e vergonha, apenas confirmam aquela frase atribuída a um general francês que, de tanto circular e se assemelhar ao que ora vivemos, fica mais uma vez atual e com sotaque sevilhano: “Este no és um país serio”. Belo Horizonte, 08/03/91, assinam Éolo Maia e equipe, José Geraldo Melasippo e equipe, Joel Campolina e equipe, Paulo Laender e equipe, Paulo Pontes e equipe e Sylvio E. de Podestá e equipe.